Carlos Nejar

Entre a prosa e a poesia, Carlos Nejar traz ao leitor uma narrativa delirante. E mesmo ao fazer prosa, Nejar faz poesia: “... Depois dormi, sonhei, sonhei quem sabe! O que falta, é o que sobra? Amar-te não é só empenhar-se em nobres causas, ou ambições sublimes, é combater, por um fio que seja, dos teus cabelos, para que te honrando, me honre. Quem ousa pôr em risco sua fortuna é que recebe a chama!”

É difícil precisar se “A Engenhosa Letícia do Pontal” - o livro, não a personagem - é uma espécie de devaneio do autor, se ele tirou inspiração dos próprios sonhos, se transformou em poesia a realidade que percebe ou se, mais provável, tudo isso junto. Quanto à personagem, o que dizer de Letícia? Letícia representa muitas coisas. Letícia é uma mulher, é todas as mulheres. Letícia é pensamento, é razão, é emoção. Letícia é guerreira. Letícia é Nuvem.

Com referências a escritores, poetas, pensadores e filósofos, Nejar faz de “A Engenhosa Letícia do Pontal” um caldeirão pulsante. O livro parece estar vivo. Nejar, através de Letícia, filosofa quando diz “Existimos em parcelas. Talvez ainda não tenha existido o suficiente, para que me vejam” e se revela lacaniano quando faz de Letícia um significante com vários significados ou em trechos que dizem “Dar nome é estar dentro!” e “Os olhos se fizeram para a fome, não a fome para os olhos - na perspectiva de Letícia. Não havendo libido sem olhos, nem instinto sem fome.” Ainda na vertente lacaniana de Nejar, são personagens-significantes o prefeito Seráfico, o alazão Alecrim, o carro Vespertino e ainda, o burro.

“A Engenhosa Letícia do Pontal” - que ocupou seu autor por 16 anos - não é um livro comum. Inteligente, contestadora e apaixonante, Letícia é o Dom Quixote de Carlos Nejar. O livro é recomendado àqueles que apreciam a boa leitura, se fascinam com poesia e não tem medo de se entregar a devaneios.… (más)